A mística dos movimentos sociais camponeses.
Palavras-chave:
Cultura Camponesa. Imaginário Poético. Mística.Resumo
Partimos da imaginação dinâmica e material direcionada por Gaston Bachelard (1990; 2008a; 2008b; 2009) para refletir na contracorrente das imagens/ações exercidas com o campo/cidade diante da tradição racionalista. Para tal, mergulhamos no cancioneiro dos poetas Gilvan Santos, Zé Pinto e Antônio Francisco, oriundos do campo e que, apesar de todas as dificuldades enfrentadas em seu cotidiano, inovam através das suas artes e, dessa maneira, ressignificam seus espaços de vida. Vinculados ao campo esses saberes locais propiciam imagens poéticas, trabalhadas aqui por intermédio do simbolismo da terra, da sua relação com a água e o modo de vida do camponês, analisados como imagens emancipatórias, surgem como fio condutores para se alcançar os objetivos centrais da educação do campo. Os cancioneiros apresentados emergem de imagens já estabelecidas e estigmatizadas pela lógica privatista e exploratória do mundo burguês para colocá-las em xeque, questioná-las e reformulá-las. São cancioneiros que produzem imagens afetivas e convidativas ao espaço, é o clamor de se viver o campo e arar a terra, a agência de novas viagens, a tentativa de reconstruir o conhecimento capaz de indicar o caminho de ultrapassagem das imagens preconceituosas e funcionalistas estabelecidas para se vivenciar códigos individualistas e privatistas em detrimento de lógicas comunitárias de existências. As imagens oferecidas pelos cancioneiros escapam às dicotomias propostas e constroem a esperança ativa, como parte do processo de busca em meio às ações políticas, culturais e pedagógicas tal como propõe a Educação do Campo. O campo permite a criação da cidade no contexto da urbanidade, constrói a cidade para posteriormente ser cooptado pelas imagens subalternas criadas em torno de si pela própria cidade. O desenho imaginário e semiológico do campo é monopolizado pela cidade em grande medida pela poética literária, musical e cinematográfica potencializado nas linguagens artísticas nacionais, ora como denúncia, ora como estereótipo, ora como crítica. Com o desvio semântico moderno - os que escaparam da sanha ocupacional colonizadora que submeteu o cultivo à monocultura e privatizou para poucos a terra de muitos -, aos que podem cultivar a sua terra foi-lhes imputados as imagens do atraso, do outro rústico, do selvagem, da caricatura do ingênuo, do jeca-tatu. E aos seus espaços a imagem do estranho, do campo como o outro, do sertão selvagem, traiçoeiro, do espaço-brenha que precisa ser ocupado, urbanizado, domado, submetido a lógica hegemônica do capital. Essas são imagens únicas, estereotipadas e que escondem um conjunto de produções, saberes e fazeres contidos nesses espaços que ainda se mantêm marginalizados pela imagem ortodoxa vigente. As poéticas apresentadas diante do simbolismo da terra, consideram as relações produzidas entre a terra e a água como elementos essenciais para a manutenção do espaço de vida do povo camponês e a sua soberania cultural, traduzem-se em crítica à realidade social hegemônica, auxiliam na desconstrução da dicotomia homem/natureza, desnaturaliza o espaço, apontando que esse é fruto das agências e astúcias humanas. Essa relação intima entre os elementos supracitados identifica o chamado que emana dos movimentos em defesa da educação do campo.